Dom Lindomar Rocha Mota
Bispo de São Luís de Montes Belos (GO)
“É na fraqueza que a força se manifesta”, com essas palavras Paulo centraliza a nossa atenção na Graça radical que Cristo nos conquistou. Uma Graça que não pode mais ser negociada por nada que lhe precedeu, nem por aquilo que ainda está porvir.
A Graça não é passageira, ela é para o mundo que está nascendo e emergindo da promessa antiga de Deus para o mundo, e não somente para os Judeus.
Uma parte importante da Profecia e da esperança de Israel era claramente a multidão acorrendo para a casa de Deus! Uma multidão justificada por um matrimônio fiel com Ele.
A fidelidade, porém, só pode ser forjada no coração e não na forma fria da lei ou no ritmo da liturgia, tentação que andava se alastrando sobremaneira no culto antigo.
Os cristãos vivem de outro modo! Entretanto, muitas vezes perdemos o passo para inclinações severas que sempre nos rodeia, isto é, de minimizar a Graça recebida como caminho para a salvação.
Paulo nos lembra de uma passagem trágica na qual Pedro, depois de ter ficado maravilhado com a conversão dos pagãos em Antioquia (Gl 2,12), afastou-se deles por receio daqueles que ainda creditavam a lei como necessária para a salvação.
Paulo se lembra com pesar de que mesmo Barnabé se afastou deles.
Membros importantes da Igreja nascente cedendo a tentação da lei. Esse exemplo seria seguido por muitos, e muitos pegariam o caminho torto. Por isso, Paulo deixa por escrito uma das mais duras reprovações feitas na era apostólica.
Ser Cristão e viver sob a dependência da lei é sinal de uma vida dissimulada. E a dissimulação dos grandes arrasta uma multidão. Por isso Paulo clamou cheio de angústia contra a atitude de Cefas, dizendo que ela foi tão maléfica, “a ponto de até Barnabé se deixar arrastar pela hipocrisia deles” (Gl 2,13).
Palavras semelhantes já haviam sido usadas por Jesus para replicar a ação dos fariseus. De fato, hipocrisia no grego antigo significa encenar. A hipocrisia é uma encenação bela no teatro, mas feia na religião e na vida. Por essa razão não podemos encenar sobre a Graça e vivermos sob o jugo da Lei.
A Graça supera a Lei. Ela é o chamamento para a realização da profecia antiga de um único povo e um único Deus. Assim, o escândalo estava instaurado, pois não era mais tão somente a adição de alguns estrangeiros ao culto judaico, algo que acontecia com certa frequência. É um Reino que pertence a todos. Os cristãos, são, agora, os herdeiros das promessas.
No ápice das discussões a questão da circuncisão e da carne sacrificada aos ídolos, que Paulo rejeita como sendo suficientes para a fidelidade à Aliança.
A justiça, portanto, tem outra nascente. Fluida a partir da fé, ela se encontra sustentada na decisão de seguir Cristo e tomá-lo como Salvador, sem dar passos atrás.
As sentenças que descoloriam o sacrifício e a circuncisão como elementos cabais da Aliança, apavoraram a religião antiga, e eles se perguntavam em seus corações, será que ousarão a questionar até a Lei.
Sim! Ousaríamos questioná-la, embora com enorme dificuldade, a ponto de Paulo nos recomendar: “Ficai firmes e não vos deixeis amarrar de novo ao jugo da escravidão” (Gl 5,1).
A lei é superada pela Graça. Sem merecimento recebemos o privilégio de sermos chamados filhos de Deus, algo que nunca se havia alcançado antes. Teórica ou praticamente não se pode passar daí. O ponto culminante que a humanidade alcança é a condição de filho, restando tão somente a tentação de regredir para uma condição mais baixa. Entretanto, já estamos suficientemente alertados e conscientes de que, quem “procura a justificação na Lei, rompe com Cristo” (Gl 5,4).