Deus habita sem se escandalizar

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Dom Lindomar Rocha Mota
Bispo de São Luís de Montes Belos (GO)

Foi num deserto que o Senhor nos encontrou! Essa verdade é conhecida e está coeva em toda a Sagrada Escritura. A verdade é essa! A beleza da Encarnação é essa! Deus nos encontra em um deserto.

O deserto é o lugar da aridez, é o lugar que representa a morte. É nele também onde João Batista anunciou Aquele que vinha, e que era maior do que ele mesmo. João sabia que não era o Messias, ele preparava o caminho do Messias.

O deserto de João se espalha, agora, pelo mundo inteiro. Desde aquele tempo foi incessante; em nenhum momento da história deixamos o deserto, o lamaçal e o pântano.  Essas figuras retiradas do nosso entorno representam a extensão completa de nossas vidas, onde somos obrigados a caminhar e a nos reinventar.  A nascer de novo.

Eis aí uma palavra-chave para relembrarmos o Natal: nascer de novo. Ao nos prepararmos para o nascimento não seja surpresa para ninguém que o bem e o mal caminham juntos, a luz e a escuridão também. A nós peregrinar! Somos peregrinos na espera d’Aquele que vem de maneira inesperada e a sua vinda ao mundo acertará o próprio mundo, aplainará as estradas, aquecerá o dia e iluminará as veredas, já nos alertava Isaías.

Jesus é o único capaz de entrar no mundo decaído e transformar a sua decadência em novidade. Assim, Ele veio naquele tempo, e continua vindo todos os dias de maneira ordinária extraordinária. Vem ordinariamente quando fazemos aquilo que Ele nos mandou, e reconhecemos no irmão o rosto velado de Deus que se desvela e pede compaixão. Vem de maneira extraordinária, mas contínua, na Eucaristia que celebramos quotidianamente. Vem na oração que fazemos sozinhos ou com a comunidade. Jesus sempre vem, está vindo e virá ainda muitas vezes neste mundo tão necessitado da sua presença. É isso que torna a encarnação maravilhosa.

Não seria, pois, espetacular a presença de Deus no Paraíso. Não é espetacular que Deus se manifeste no seu Céu, pois lá é a sua morada. Maravilhoso é Ele vir ao nosso deserto. No deserto quotidiano da existência que nos obriga a olhar para uma distância maior do que aquela que os nossos olhos podem alcançar.

Com pouca chance de abarcar a extensão daquilo que está à nossa frente continuamos a olhar assim mesmo, e de repente esse olhar se torna Esperança, porque só a Esperança pode nos fazer ver além dos olhos. Foi neste deserto que Jesus nos achou, bem como já havia cantado o Deuteronômio.

Deus achou o seu povo no deserto. Hoje também somos achados no deserto da história e nos pântanos do mundo, onde custamos a compreender até as coisas mais simples.

Mas não seria graça se a Graça não fosse dada àqueles que precisam mais. Ainda vale o dito de Jesus quando exclamou milhares de anos atrás: não se escandalizem comigo, não se escandalizem com o Reino de Deus! Não nos escandalizemos, já que não temos o direito de nos escandalizarmos, pois como aquele homem que pagou o mesmo aos empregados que trabalharam somente uma hora o que havia pagado aos que penaram o dia inteiro, Deus distribui os seus bens como quer e do jeito que quer. Nós não somos donos, no máximo somos administradores que recebemos uma recomendação para permanecermos fiéis e vigilantes; firmes na Esperança, sem nos tornarmos juízes deste mundo, nem de ninguém!

O que estamos celebrando é, pois, a história de Deus que vem ao mundo, um mundo que não é digno de Deus, mesmo assim Ele vem! Vem e habita no meio de nós. Sem correr ou se escandalizar, Ele habita!

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