Dom Lindomar Rocha Mota
Bispo de São Luís de Montes Belos (GO)
A liberdade é a primeira virtude das democracias, e um bem desejado de altíssima consideração para a humanidade. Foi ela construída a duras penas pelo raciocínio dos filósofos e pelo duríssimo testemunho dos que doam a vida para preservá-la!
É por ela que se alcança os pináculos da criatividade e a justeza da vida social. Tanto aclamada é que comparece em todos os textos relevantes da história humana. Há pouco mais de dois séculos ela começou a se estruturar na esteira dos direitos fundamentais, e a constituir uma família básica, que deve ser respeitada por todos. São membros desta família ilustre a liberdade de consciência, liberdade de ir e vir e liberdade de expressão.
Nos dias atuais esta última, a liberdade de expressão, tem atraído o olhares para si, mediante a quase infinda possibilidade que nos alcançou por meio da comunicação digital.
Convém pensar que as liberdades formam uma família, e, mediante este laço histórico, não pode ser considerada separadamente. A liberdade de expressão não pode se sobrepor à liberdade de ir e vir, sob pena de ser mera formalidade numa tábua de direitos fracassados. Não se pode defender uma sem respeitar às demais. Do mesmo modo, não se pode excluir a liberdade de consciência, que envolve crença religiosa, política e concepções particulares do bem.
Assim, portanto, defender apenas o direito de expressão livre, e, contrariamente, defender o encerramento de fronteiras, desprezo pelas divergências razoáveis e ideias restritas de bem, não condiz com a liberdade.
Considerando ainda que a liberdade de expressão é uma atividade social e mais comunitária que as outras, por óbvias razões de que sempre falamos para alguém e sobre alguém, ela exige um critério a mais de responsabilidade.
Franz Rosenzweig, escreveu certa vez, sobre uma senhora bela na costa Leste dos Estados Unidos, conhecida por todos nós, representando a liberdade. Dizia ele - ressinto-me de que na costa Oeste não exista também uma estátua dedicada à responsabilidade.
A questão parece bem-posta. Ladeando a liberdade deveríamos sempre poder enxergar a responsabilidade.
Hegel levava tão a sério a liberdade que defendia o direito do delinquente à sua pena. A pena é o modo extremo pelo qual a sociedade reconhece a liberdade de alguém. O contrário seria negá-la, e considerar que o indivíduo não era capaz de responsabilidade.
A liberdade de expressão permite o discurso. Não o impede de antemão, mas estabelece regras para que o seu autor seja punido se a sua fala desconsiderar os princípios razoáveis da estima e do autorrespeito dos demais. As regras devem ser postas, mas devem ser ajustadas também ao longo do tempo, uma vez que a sociedade está em sempre em movimento.
Estabelecer princípios contra calunias, difamações, injurias, grosserias e mentiras que prejudicam a outros, faz parte da liberdade reflexiva de uma sociedade bem-ordenada, que estima tanto a liberdade do outro que exige que ele mesmo se responsabilize por ela.